Do Gross Up no Cálculo do ICMS

15 de março de 2024, Comment off

Do Gross Up no Cálculo do ICMS

A expressão gross up representa uma forma de cálculo utilizada para repassar o valor dos tributos ao consumidor final, elevando o valor final do produto para alcançar o lucro líquido desejado. Ele é utilizado para a formação de preço, considerando os valores de PIS, COFINS e ICMS incidentes sobre a operação, de modo que o pagamento desses tributos não influencie o valor final a ser obtido com a venda de determinado item.

Isso ocorre porque os tributos indiretos tais como ICMS, PIS e COFINS constituem suas próprias bases de cálculo e assim, a mera subtração do ICMS destacado da base de cálculo das contribuições não exclui a totalidade do ICMS incidente sobre a operação.

Em um exemplo prático, considerando a alíquota de ICMS de 18%, 1,65% de PIS e 7,60 de COFINS, tem-se a soma da tributação de 27,25%. Assim, o valor líquido a ser recebido corresponderá a 72,75% do preço final (100% – 27,25%).

Caso o valor líquido que se pretenda receber é R$ 100,00, aplicando-se uma regra de três, onde R$ 100,00 corresponde a 72,75% do valor total, para alcançar os 100% chegamos a um valor final da mercadoria de R$ 137,45 (já incluídos todos os tributos).

Nesse exemplo, o ICMS destacado é 18% sobre o valor final do produto (R$ 137,45*18%), que daria R$ 24,74.

Entretanto, para o cálculo do ICMS incidente sobre a operação, considerando a parte utilizada no cálculo do gross up é necessário fazer o cálculo considerando apenas a incidência de PIS e COFINS os quais, no exemplo seria 9,25% e não mais os 27,25%.

Assim, aplicando o mesmo critério o valor líquido recebido passa a corresponder a um percentual de 90,75% e com a regra de três, chega-se a um valor final da mercadoria de R$ 110,19.

Portanto, se com o ICMS o preço final da mercadoria seria R$ 137,45 e sem o ICMS seria R$ 110,19, conclui-se que o ICMS incidente na operação é R$ 27,26.

Assim, o ICMS incidente (R$ 27,26), considerando o gross up, é maior que o ICMS destacado (R$ 24,74).

I – Da Decisão do STF – Exclusão do ICMS da Base de Cálculo do PIS e da Cofins

Em julgamento do Tema 69, ocorrido em 02/10/2017, o STF entendeu que o ICMS não seria receita tributável pelo PIS e pela COFINS, uma vez que o valor do imposto não representa acréscimo patrimonial ao contribuinte, transitando apenas temporariamente pelos registros contábeis da empresa até o futuro repasse aos cofres públicos estaduais.

Em busca de uma decisão mais favorável, a Secretaria da Receita Federal inicialmente se manifestou no sentido que o ICMS a ser excluído da base de cálculo das contribuições seria o ICMS recolhido pelo contribuinte, ou seja, aquele resultante de sua apuração não cumulativa (débito menos crédito).

No entanto, em 13/05/2021, em sede de embargos de declaração, o STF firmou o entendimento que deu fim aos questionamentos, fixando definitivamente, a tese de exclusão com a respectiva modulação de efeitos no seguinte sentido:

  • O ICMS a ser excluído da base de cálculo é o destacado na nota fiscal do contribuinte;
  • os efeitos da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS devem se dar após 15/03/2017, ressalvadas as ações judiciais e requerimentos administrativos protocolados até tal data.

Com o trânsito em julgado da decisão, em 26 de maio de 2021, foi publicado o Despacho PGFN nº 246, que aprovou o Parecer SEI nº 7698/2021/ME da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN), com orientações para que a Receita Federal cumprisse a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal.

O parecer definiu orientações acerca das cobranças relativas ao PIS e a Cofins a serem ajustadas para todos os contribuintes a partir de 16 de março de 2017, autorizando a revisão de ofício de lançamento e repetição de indébito no âmbito administrativo, bem como dispensando a obrigação de contestação e recursos no âmbito judicial.

No que se refere aos aspectos operacionais, a Receita Federal publicou em 18/06/2021, o Guia Prático da EFD Contribuições – Versão 1.35 que, na Seção 12 do Capítulo I pormenorizou os procedimentos necessários à operacionalização dos ajustes de exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/COFINS, inclusive, com exemplos de como deve ser realizado o ajuste.

Seção 12 – Operacionalização dos ajustes de exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins

Caso a pessoa jurídica ainda não tenha efetuado os ajustes da base de cálculo, com a exclusão da parcela do ICMS destacado em documento fiscal, estes ajustes deverão ser efetuados mediante:

     transmissão da EFD-Contribuições original com os devidos ajustes, caso não tenha efetuado a transmissão referente ao período; ou

     retificação da escrituração originalmente transmitida (vide Seção 9 – Retificação de Escrituração). (grifou-se)

Destarte, todas as habilitações referentes aos processos judiciais transitados em julgado foram realizadas com base nesse entendimento, assim como as recuperações administrativas realizadas.

II – Das Recentes Alterações Legislativas Relativas ao PIS e à Cofins

Com o objetivo de se adequar a legislação à citada decisão do STF, foi editada a Medida Provisória nº 1.159/2023, posteriormente convertida na Lei nº 14.592/2023, que promoveu importantes alterações nas Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03, que tratam do PIS e da COFINS não-cumulativos, respectivamente.

As alterações no art. 1º, § 3º, inciso XIV, da Lei nº 10.637/02, e no art. 1º, § 3º, inciso XIII, da Lei nº 10.833/03 passaram a estabelecer que as receitas decorrentes do ICMS incidente sobre as operações de vendas de mercadorias devem ser excluídas das bases de cálculo de PIS e COFINS.

 Art. 1º A Contribuição para o PIS/Pasep, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.

3o Não integram a base de cálculo a que se refere este artigo, as receitas:

XIV – relativas ao valor do ICMS que tenha incidido sobre a operação. 

 

Art. 1º A Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins, com a incidência não cumulativa, incide sobre o total das receitas auferidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil.

3o Não integram a base de cálculo a que se refere este artigo as receitas:

XIII – relativas ao valor do ICMS que tenha incidido sobre a operação.  

Insta ressaltar significativa distinção entre a nomenclatura utilizada pela legislação “ICMS incidente” da utilizada pelo STF “ICMS destacado” e aquela utilizada inicialmente pela Secretaria de Receita Federal “ICMS recolhido”.

Assim, para o cálculo do ICMS incidente, pode-se entender necessária a aplicação do gross up, resultando em valor superior ao ICMS destacado no documento fiscal.

III – Da Aplicação da Nova Lei aos Créditos Já Apurados

Atualmente tem-se discutido se a nova legislação afeta o cálculo da exclusão do ICMS da base de cálculo de PIS e COFINS realizado pelos contribuintes, seja aquelas que realizaram a habilitação de seus processos judiciais transitados em julgado, seja daqueles que, por meio da retificação das obrigações acessórias constituíram o indébito.

Importante destacar que a referida Medida Provisória entrou em vigor no dia 1º de maio de 2023 o que, inicialmente, gera dúvida acerca de sua aplicação a situações pretéritas.

Ademais, nos casos em que houve habilitação, ela ocorreu com base em sentença transitada em julgado e, salvo melhor juízo, a legislação posterior não tem o condão de alterar seu conteúdo. E ainda, a habilitação foi realizada com base no ICMS destacado e, em termos processuais, não há fundamento que autorize o cálculo de forma diversa do que foi decido pelo STF.

Em que pese o entendimento de grandes advogados tributaristas, o tema ainda será objeto de intensa discussão e não se sabe, ainda, qual será o entendimento reconhecido administrativamente pela Secretaria da Receita Federal ou, ainda, pelo judiciário.

Frente ao exposto, verifica-se que o recálculo do crédito, resultante da diferença entre a exclusão do ICMS destacado e a exclusão do ICMS incidente da base de cálculo de PIS e COFINS, é passível de questionamento administrativo, podendo resultar em passivo para empresa.

Nesse sentido, salvo melhor juízo, o procedimento mais seguro seria pleitear o valor judicialmente.

O Grupo Gram está à disposição para mais informações e detalhes sobre o tema.

Fonte: por Andreia Carvalho de Melo e Déborah Amorim Silva.