8 de janeiro de 2021, Comment off

Obrigatoriedade de pró-labore para sócios administradores

Do ponto de vista jurídico/legal, é possível afirmar que não existe qualquer comando legal que obrigue textualmente e taxativamente um sócio a retirar pró-labore.

Porém, haja vista o interesse na arrecadação, existe interpretação que divide os sócios de uma empresa em dois tipos de sócios: o sócio capitalista/investidor e o sócio atuante ou administrador. O sócio capitalista é aquele que colocou dinheiro no negócio, mas não se envolve no trabalho diário, recebendo, desse modo, apenas eventual lucro apurado. Já o sócio atuante, aquele, ou aqueles, que, embora também tenham contribuído financeiramente para o capital da empresa, cuidam da gestão e administração. Nesse sentido, possui direito à distribuição de lucros e, segundo o entendimento da RFB, deve também ser remunerado pelo recebimento de pró-labore.  

A principal tese da Receita Federal se baseia no Decreto nº 3.048/99, o qual inclui no rol de contribuintes individuais (obrigatórios) os sócios que recebem remuneração decorrente do trabalho.

Entretanto, como dito, não há qualquer legislação que obrigue o sócio à retirada de pro labore. A própria Receita Federal do Brasil já respondeu consulta a esse respeito, conforme segue:

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 196 de 18 de Outubro de 2012

ASSUNTO: Contribuições Sociais Previdenciárias

EMENTA: SOCIEDADE SIMPLES. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PROFISSIONAIS RELATIVOS AO EXERCÍCIO DE PROFISSÕES LEGALMENTE REGULAMENTADAS CONTRIBUINTE INDIVIDUAL (SÓCIO). PRO-LABORE. REFORMA DA SOLUÇÃO DE CONSULTA SRRF09/DISIT N. 133/2012.

Atualmente não há dispositivo legal que determine a obrigatoriedade de remuneração de sócios de sociedade simples mediante pró-labore. Não há dispositivo legal que determine a obrigatoriedade de remuneração de sócios de sociedade simples mediante pró-labore. De acordo com o art. 201, § 5o, II, 1a parte, do Decreto n. 3.048/99, no caso de pagamentos (ou créditos) ao final do exercício, se estiver estipulado previamente, em contrato social (CC, art. 997, VII), que a sociedade não pagará pró-labore (isto é, os sócios-administradores serão remunerados só em função da lucratividade do capital – distribuição de lucros), há discriminação entre essas formas de pagamento, o que leva ao não recolhimento da contribuição previdenciária por inocorrência do fato imponível tributário (fato gerador). O prévio acerto intersócios de que a sociedade não os remunerará pelo trabalho (pró-labore), mas tão-somente em função do resultado (distribuição de lucros), serve de discriminação para afastar a incidência tributária relativa a esta hipótese de incidência. Decerto, previamente ao pagamento (ou crédito) deve haver a apuração do resultado que demonstre que houve lucro a ser distribuído. No caso de pagamentos (ou créditos) durante o exercício (art. 201, § 5o, II, parte final, do Decreto n. 3.048/99), não se considera adiantamento de lucros se houver balanço (ou balancete) prévio ao pagamento, o qual demonstre que a distribuição de lucro decorra efetivamente do resultado positivo (lucro) apurado previamente. Decerto, também nessa hipótese persiste a necessidade de prévia discriminação em contrato social (CC, art. 997, VII) em que fique discriminado que a sociedade somente remunerará o (s) sócio (s) -administrador (es) por meio de distribuição de lucros. O desatendimento a qualquer desses requisitos implica a incidência da contribuição previdenciária. Se houver recolhimento de contribuição previdenciária pelo sócio administrador (segurado obrigatório – contribuinte individual) em razão do pagamento ou crédito relativo a antecipação de distribuição de lucros, é incabível a repetição do indébito, porquanto a relação do contribuinte individual (segurado obrigatório) perante à previdência social não é apenas jurídico-tributária. Ao recolher a contribuição previdenciária aos cofres públicos, não só o contribuinte individual (segurado especial) mas também seu (s) dependente (s) passam a gozar imediatamente (sem carência) da proteção previdenciária estatal para determinados benefícios, a depender do infortúnio. Ao recolher a contribuição previdenciária, o contribuinte individual (segurado obrigatório) tem uma relação jurídico-tributária previdenciária, pois o contribuinte individual e a previdência social são reciprocamente devedores e credores: enquanto o contribuinte individual é devedor tributário da contribuição previdenciária e credor da proteção previdenciária; a previdência estatal é credora tributária da contribuição previdenciária (através da Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB) e devedora (através do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS) da proteção previdenciária.

Portanto, há uma relação comutativa entre o contribuinte individual e a previdência social. Deveras, o sócio administrador que não tenha recolhimento da respectiva contribuição previdenciária, em função do contrato social estabelecer que sua remuneração dar-se-á somente por meio da distribuição de lucros, não está proibido de se filiar à previdência estatal na qualidade de segurado facultativo, ou seja, pode, se quiser, recolher facultativamente para se ver protegido pela previdência estatal.

Por outro lado, mesmo com os argumentos trazidos acima, não raro empresas se deparam com atuação de fiscais tributários (fiscalizações, ações de cobrança e até mesmo obstruções da emissão de CND), sob o argumento de que pelo menos o sócio administrador deve obrigatoriamente retirar pro labore.

Em Solução de Consulta mais recente, de 2017, há posicionamento no sentido de que pelo menos parte dos valores pagos pela sociedade ao sócio que presta serviço à sociedade terá necessariamente natureza jurídica de retribuição pelo trabalho, sujeita, portanto, à incidência de contribuição previdenciária, confira-se:

SOLUÇÃO DE CONSULTA DISIT/SRRF10 Nº 10005, DE 20 DE FEVEREIRO DE 2017

(Publicado(a) no DOU de 12/04/2017, seção 1, página 33)  

ASSUNTO: Contribuições Sociais Previdenciárias

EMENTA: SÓCIO. PRÓ-LABORE. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO.

O sócio da sociedade civil de prestação de serviços profissionais que presta serviços à sociedade da qual é sócio é segurado obrigatório na categoria de contribuinte individual, conforme a alínea “f” do inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991, sendo obrigatória a discriminação entre a parcela da distribuição de lucro e aquela paga pelo trabalho.

O fato gerador da contribuição previdenciária ocorre no mês em que for paga ou creditada a remuneração do contribuinte individual.

Pelo menos parte dos valores pagos pela sociedade ao sócio que presta serviço à sociedade terá necessariamente natureza jurídica de retribuição pelo trabalho, sujeita à incidência de contribuição previdenciária, prevista no art. 21 e no inciso III do art. 22, na forma do § 4º do art. 30, todos da Lei nº 8.212, de 1991, e no art. 4º da Lei nº 10.666, de 8 de maio de 2003.

SOLUÇÃO DE CONSULTA VINCULADA À SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 120, DE 17 DE AGOSTO DE 2016.

DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 8.212, de 1991, art. 12, inciso V, alínea “f”, art. 21, art. 22, inciso III, art. 30 § 4º; Lei nº 10.666, de 2003, art. 4º; Decreto nº 3.048, de 1999, art. 201, § 5º; Instrução Normativa RFB nº 971, de 2009, art. 52, inciso I, alínea “b”, e inciso III, alínea “b”, e art. 57, incisos I e II e § 6º.

Pelo exposto, em função dos posicionamentos controversos sobre a matéria e para mitigar o risco de eventuais autuações, recomenda-se que, por precaução, os sócios administradores retirem em forma de pro labore ao menos o valor mínimo mensal de um salário mínimo federal.