11 de fevereiro de 2022, Comment off

CONSIDERAÇÕES SOBRE A SOCIEDADE ANÔNIMA DO FUTEBOL (SAF)

Por Priscila Ferreira Andrade Pinto. A organização societária das entidades de práticas desportivas, sobretudo o futebol, foi parcialmente regulamentada pela Lei Federal nº 9.615/98 (Lei Pelé). Porém, em agosto de 2021 foi sancionada a Lei nº 14.193/2021– “Lei do Clube Empresa” que permite aos clubes a conversão para Sociedade Anônima do Futebol (SAF), além de dispor sobre normas de constituição, governança, controle e transparência, meios de financiamento da atividade futebolística, tratamento dos passivos das entidades de práticas desportivas e regime tributário específico.

Tendo em vista que a grande maioria dos clubes de futebol no Brasil são constituídos sob a forma de associações sem fins lucrativos, a nova formatação jurídica estabelecida pela lei traria maiores garantias legais para possíveis investidores que poderão optar pela compra de cotas menores ou até mesmo pela aquisição integral do clube.

O que é e como criar uma S.A.F


A S.A.F. é uma Sociedade Anônima do Futebol, sujeita às regras específicas da nova lei, cujo objeto social poderá compreender as seguintes atividades:

a) o fomento e o desenvolvimento de atividades relacionadas com a prática do futebol, obrigatoriamente nas suas modalidades feminino e masculino;

b) a formação de atleta profissional de futebol, nas modalidades feminino e masculino, e a obtenção de receitas decorrentes da transação dos seus direitos desportivos;

c) a exploração, sob qualquer forma, dos direitos de propriedade intelectual de sua titularidade ou dos quais seja cessionária, incluídos os cedidos pelo clube ou pessoa jurídica original que a constituiu;

d) a exploração de direitos de propriedade intelectual de terceiros, relacionados ao futebol;

e) a exploração econômica de ativos, inclusive imobiliários, sobre os quais detenha direitos;
f) quaisquer outras atividades conexas ao futebol e ao patrimônio da Sociedade Anônima do Futebol, incluída a organização de espetáculos esportivos, sociais ou culturais;
g) a participação em outra sociedade, como sócio ou acionista, no território nacional, cujo objeto seja uma ou mais das atividades mencionadas acima, com exceção do item B.

A Sociedade Anônima do Futebol pode ser constituída:

a) pela transformação do clube de futebol em Sociedade Anônima do Futebol, de modo que o CNPJ permanece o mesmo, preservando na mesma organização todos ativos, passivos, direitos e deveres, contudo, sob nova roupagem, novo tipo jurídico. Os até então associados/sócios passam a ser acionistas da SAF.

b) pela cisão do departamento de futebol do clube e transferência do seu patrimônio relacionado à atividade futebol; de modo que o clube continuará desempenhando suas atividades sociais e outras modalidades esportivas através da associação ou sociedade empresária, conforme o caso, e transferirá à SAF todos os direitos e deveres vinculados à atividade do futebol. Além disso, elencamos algumas condições que deverão ser observadas na cisão:

  1. Todos os direitos e deveres vinculados à atividade do futebol deverão obrigatoriamente ser transferidos à SAF, o que inclui direitos de participação em competições profissionais e os contratos com atletas;
  2. Clube e SAF deverão contratar, na data de constituição desta, a utilização e o pagamento de remuneração decorrente da exploração pela SAF de direitos de propriedade intelectual de titularidade do clube;
  3. Se as instalações desportivas, como estádio, arena e centro de treinamento, não forem transferidas para a SAF, o clube e a SAF deverão celebrar, na data de constituição desta, contrato no qual se estabelecerão as condições para utilização das instalações;
  4. O clube ou pessoa jurídica original não poderá participar, direta ou indiretamente, de competições profissionais do futebol, sendo a participação prerrogativa da SAF por ele constituída; e
  5. A SAF emitirá obrigatoriamente ações ordinárias da classe A para subscrição exclusivamente pelo clube ou pessoa jurídica original que a constituiu.

c) pela iniciativa de pessoa natural ou jurídica ou de fundo de investimento.

Sucessão de obrigações na constituição de uma SAF

Nas duas primeiras hipóteses acima elencadas, a SAF sucede obrigatoriamente o clube de futebol nas relações com as entidades de administração, bem como nas relações contratuais, de qualquer natureza, com atletas profissionais do futebol. Além disso, a Sociedade Anônima do Futebol terá o direito de participar de campeonatos, copas ou torneios em substituição ao clube ou pessoa jurídica original, nas mesmas condições em que se encontravam no momento da sucessão, competindo às entidades de administração a devida substituição sem quaisquer prejuízos de ordem desportiva.

Cumpre ressaltar que, no caso da SAF ser criada pela cisão do departamento de futebol do clube, a Sociedade Anônima do Futebol não responde pelas obrigações do que a constituiu, anteriores ou posteriores à data de sua constituição, exceto quanto às atividades específicas do seu objeto social, cujo pagamento aos credores se limitará à forma assim estabelecida:

a) por destinação de 20% (vinte por cento) das receitas correntes mensais auferidas pela Sociedade Anônima do Futebol, conforme plano aprovado pelos credores;

b) por destinação de 50% (cinquenta por cento) dos dividendos, dos juros sobre o capital próprio ou de outra remuneração recebida desta, na condição de acionista.

O clube poderá efetuar o pagamento das obrigações diretamente aos seus credores, pelo concurso de credores, por intermédio do Regime Centralizado de Execuções previsto na Lei. Se assim optar, o clube terá o prazo de 6 (seis) anos para pagamento dos credores, prorrogáveis por mais 4 (quatro) anos.

Regime especial de tributação da SAF


A Sociedade Anônima do Futebol fica sujeita ao Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF). O TEF engloba, mediante o recolhimento mensal num documento único de arrecadação, os seguintes impostos e contribuições, a serem apurados seguindo o regime de caixa:

I – Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ);

II – Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição para o PIS/Pasep);

III – Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL);

IV – Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins); e

V – contribuições de terceiros.

Nos 5 (cinco) primeiros anos-calendário da constituição da Sociedade Anônima do Futebol ficará ela sujeita ao pagamento mensal e unificado dos tributos acima referidos, à alíquota de 5% (cinco por cento) das receitas mensais recebidas. A partir do início do sexto ano-calendário da constituição da Sociedade Anônima do Futebol, o TEF incidirá à alíquota de 4% (quatro por cento) da receita mensal recebida.

As dívidas tributárias do clube anteriores à constituição da Sociedade Anônima do Futebol, não incluídos em programas de refinanciamento do governo federal (como o PROFUT), poderão ser alvo de proposta de transação nos termos de lei específica.